A 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, negou recurso e manteve sentença que julgou improcedente uma Ação de Indenização para Reparação de Danos Materiais e Morais movida pelos pais e a irmã de um rapaz que foi vítima de acidente em linha férrea, no ano de 2011, contra a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU).
O caso
Segundo consta nos autos, a vítima, ao retornar a sua residência no dia 8 de fevereiro de 2011, por volta de 15h29min, sofreu atropelamento pelo trem de propriedade da CBTU, o que trouxe graves danos na cabeça, com perda da massa cefálica, com sequelas irreversíveis.
Entretanto, a 11ª Vara Cível de Natal julgou improcedente o pedido inicial sob o argumento de que o acidente ferroviário que causou o atropelamento ocorreu devido a culpa exclusiva da vítima, e, por isso, houve o afastamento do nexo de causalidade entre a conduta da empresa pública e o sinistro. O Juízo de Primeiro Grau entendeu que a vítima agiu deliberadamente ao atravessar a linha férrea com a passagem do trem.
Este entendimento foi baseado na documentação anexada aos autos, e, por isto, a Justiça entendeu por bem afastar a relação de causa e efeito entre seu ato e o prejuízo experimentado pelo lesado, não havendo, pois, responsabilidade civil da Companhia pelos danos suportados pelos autores (familiares da vítima).
Recurso
No recurso ao TJRN, os autores argumentaram que a vítima, filhos de dois apelantes e irmão do outro, sofreu lesão gravíssima na linha férrea, cabendo à CBTU, na condição de concessionária do serviço público, ser responsabilizada objetivamente pelo ocorrido, uma vez que não promoveu a construção de cercas protetoras no local, já que se trata de passagem de nível utilizada por outros veículos.
Os autores prosseguiram afirmando que há comprovação de falhas e defeitos na sinalização e segurança das faixas de domínio ferroviário, onde é comum a ocorrência de acidentes fatais, prejudicando o direito ao trânsito seguro da população. Pediu, ao final, pela condenação da CBTU ao pagamento de indenização por danos morais, além de ser obrigado a arcar com as custas processuais e honorários advocatícios.
A CBTU alegou, preliminarmente, que houve modificação do status da Companhia Brasileira de Trens Urbanos de sociedade de economia mista para empresa pública, situação que desloca a competência para julgamento da demanda para a Justiça Federal. Argumentou a ausência de responsabilidade contratual no caso, haja vista a ocorrência da excludente de culpa exclusiva da vítima, o que exime a responsabilidade civil da empresa.
Voto
O relator do processo no TJ, desembargador Virgílio Fernandes Jr., a despeito da alteração societária mencionada pela CBTU, reconheceu sua competência para apreciação do recurso, uma vez que a sentença foi proferida em 2017, portanto, antes da modificação do status da Companhia, fato esse que firma a competência recursal do Tribunal de Justiça.
Ele esclareceu que, no caso, a despeito da constatação de que o trecho ferroviário em que ocorreu o acidente situa-se dentro do perímetro urbano, sendo, pois, inequívoco o dever da concessionária do serviço público de realizar a devida fiscalização, atuando de modo preventivo, a impedir o acesso ou a transposição das vias férreas em locais inapropriados, sem sinalização e assistência, a prova colhida nos autos é segura quanto à culpa exclusiva da vítima, apta a afastar a responsabilização da CBTU.
“Ora, o boletim de ocorrência feito pelo Núcleo de Policiamento Rodoviário dá notícia de que o condutor do veículo acionou faróis e buzina, em momento um pouco anterior ao acidente, no intuito de alertar a vítima que atravessava repentinamente na frente do trem, inclusive ressaltaram que no cruzamento encontravam-se diversos carros parados aguardando a passagem do veículo”, comentou.
Além do mais, o relator considerou as imagens relativas à sinalização constante em documento nos autos que possibilitam a constatação de que havia sinalização horizontal, vertical e luminosa, bem como passagem de nível. Ele destacou ainda que o acidente ocorreu na luz do dia, circunstância que dá a convicção de o local reunia condições suficientes para a vítima saber da proximidade do trem e, mesmo assim, posicionou-se em local indevido.