Os desembargadores integrantes da Câmara Criminal do TJRN, ao julgarem um Agravo, debateram, dentre outros pontos do julgamento, o chamado “overruling”, prática originária dos tribunais norte-americanos e que ocorre apenas em casos excepcionais. São aqueles em que os fundamentos dos precedentes de decisões anteriores não mais se apresentam como adequados ao contexto social ou político e aos reclames atuais de justiça da sociedade, como destacam juristas que se debruçam sobre o tema.
O debate, desta feita, é relacionado ao recurso movido pela defesa de Renato da Silva Marinho, acusado da prática de vários assaltos a agências dos Correios no Estado e que foi um dos presos na operação “Espectros”, deflagrada pela Polícia Civil em Macaíba, em abril de 2019.
O recurso, acatado à unanimidade de votos no órgão julgador, pedia uma nova apreciação para o que foi definido pelo Juízo da Vara de Execuções Penais de Nísia Floresta, o qual, nos autos do processo nº 0030969-51.2009.8.20.0001, deferiu a alteração da data-base da pena. Contudo, a defesa alegou, dentre outros pontos, que deve prevalecer o precedente da diretriz jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para constar no termo a data do trânsito da última prisão.
A decisão debateu, desta forma, que a superação de um precedente ou de um entendimento jurisprudencial (overruling) pode dar-se, no Brasil, somente em processo que, chegando ao tribunal, permita a superação do precedente anterior.
“Como estabelecido, a revogação dos precedentes pode ocorrer tanto de forma horizontal como vertical, quando o órgão revoga seu próprio precedente, ou quando um tribunal hierarquicamente superior assim o faz”, explica a relatoria do voto, ao destacar juristas como Bruno Garcia Redondo, o qual defende também que é preciso levar em conta que o ‘overruling’ deve ser realizado pelo mesmo tribunal que estabilizou o precedente, com a autoridade de analisar sua inaplicabilidade, em motivos específicos.
Superação do precedente
A relatoria ainda ressaltou que a demanda em questão também debate acerca da possibilidade dos tribunais inferiores se anteciparem às cortes superiores e decidirem pela superação do precedente, uma pretensão, segundo o relator, desembargador Saraiva Sobrinho, pautada no movimento denominado ‘antecipatory overruling’, oriunda dos tribunais estadunidenses e que ocorre na inadequação atual dos precedentes.
“Na demanda em questão, não se verifica a perda de congruência dos precedentes com o senso de justiça, nem a diminuição de sua eficácia por descompasso com os valores sociais, políticos, econômicos ou jurídicos vigentes. Pelo contrário, o STJ tem reiterado o entendimento consolidado, não podendo decisões isoladas do Excelso Pretório servirem de baldrame à sua superação”, define.
Dentre as conclusões do voto, foi destacado que a alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios, em razão da unificação das penas, não encontra respaldo legal. Portanto, a desconsideração do período de cumprimento de pena desde a última prisão ou desde a última infração disciplinar, seja por delito ocorrido antes do início da execução da pena, seja por crime praticado depois e já apontado como falta disciplinar grave, configura excesso de execução.
(Agravo em Execução Penal nº 0803197-97.2020.8.20.0000)