O presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, refutou nesta terça-feira (3/3) respostas “simplistas” a problemas complexos, como a situação do sistema prisional brasileiro. “Não há caminho para a superação do ‘estado de coisas inconstitucional’ do sistema prisional senão pela compreensão do caráter estrutural da crise que enfrentamos. Só seremos capazes de promover mudanças efetivas quando as soluções forem capazes de atacar as raízes dos nossos problemas.”
Toffoli participou da abertura do seminário internacional Judiciário, sistema penal e sistema socioeducativo: questões estruturais e mudanças necessárias, organizado pelo CNJ e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e que está sendo realizado em Brasília até quarta (4/3). Durante o evento, especialistas brasileiros e estrangeiros debatem a política do aprisionamento e saídas para o modelo punitivo que coloca o Brasil entre os países com mais pessoas presas no mundo.
O ministro comentou os resultados do estudo inédito sobre a reincidência no Brasil, apresentado na cerimônia de abertura. “Partindo das bases de dados do próprio Conselho Nacional de Justiça, o estudo comparou estatísticas do sistema socioeducativo e do sistema prisional, concluindo que a taxa de reentrada no sistema prisional é bastante superior àquela encontrada no sistema socioeducativo.”
Comparando uma amostra dos processos de 5.544 adolescentes com passagens pelo sistema socioeducativo à de ações penais de 82.063 adultos presos, concluiu-se que 22,9% dos adolescentes com uma sentença condenatória voltam a ser condenados. Entre os adultos, o índice chega a 42,5%. A base de dados usada para os adolescentes foi o Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei (CNACL) e, para os adultos, o repositório processual chamado de Replicação Nacional – ambos do CNJ. O período analisado foi de 2015 a 2019.
Políticas públicas
Para o corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, Dias Toffoli estabeleceu um conjunto de ações para a área penal durante sua gestão que ganha contornos de política judiciária, ao prever a articulação de diversos órgãos e instituições para o real enfrentamento da questão prisional. Como exemplo, ele cita o Programa Justiça Presente, forte parceria entre o CNJ e os tribunais de todo o país, “no compromisso conjunto da qualificação de suas atividades e da performance de toda a magistratura, da promoção da cidadania e garantia de direitos das pessoas privadas de liberdade, bem como para a qualificação da gestão da informação e melhoria do sistema prisional brasileiro como um todo”.
Para o representante do PNUD, Carlos Arboleda, qualificar as políticas judiciárias é um investimento nas pessoas, na paz e no planeta. Ele sustentou que a “efetiva integração social e econômica” de pessoas que passaram pelo sistema prisional e socioeducativo demanda um novo olhar para as trajetórias delas e constitui um desafio para alcançar novos estágios de desenvolvimento. “Em um mundo sem justiça, não há como acelerar o progresso rumo a patamares cada vez mais elevados de desenvolvimento e alcançar os compromissos da Agenda 2030 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.”
Experiências como a do Justiça Presente elevam o Brasil a uma posição de destaque no plano da cooperação internacional na área da Justiça, contou o diretor da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), embaixador Ruy Pereira. “As soluções implementadas por iniciativa deste CNJ demonstram a capacidade do país de enfrentar com inteligência e equilíbrio o desafio de promover a garantia de direitos e os elementos básicos do exercício da cidadania para um segmento significativo da população privado de liberdade, creditando o Brasil a se posicionar de forma pró-ativa em debates internacionais sobre o assunto.”
Diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen/MJSP) – que também é parceiro do programa Justiça Presente –, Fabiano Bordignon reafirmou a parceria com o CNJ e anunciou para final de março um ranking prisional da qualidade dos cerca de 1,5 mil estabelecimentos do sistema carcerário, avaliando gestão, segurança e assistência. “Divulgar dados sobre a qualidade dos serviços penais é uma obrigação que o Depen pretende entregar para a sociedade brasileira neste mês de março e fico feliz de dizer que há mais as unidades com nota A do que aquelas com a pior nota. A partir daí, com o trabalho de todos nós, e da sociedade, vamos melhorar – e estamos melhorando – o sistema prisional brasileiro, e isso é um trabalho de todos.”