As regras para pagamento de precatórios foram alteradas pelo plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no último dia 3. O Conselho aprovou nova resolução sobre o tema, visando uniformizar os procedimentos adotados pelos tribunais de todo o País, em conformidade com as mudanças constitucionais surgidas nos últimos anos.
Entre as alterações está a regulamentação do disposto no § 2º da Constituição Federal, por meio da qual será viabilizado o pagamento da chamada “parcela superpreferencial do crédito alimentar”, de forma desvinculada do precatório, como manda o texto constitucional. O pagamento, limitado ao triplo do valor das obrigações de pequeno valor, e descontado do valor total da execução, é direito reconhecido a credores idosos, doentes graves e pessoas com deficiência, e agora deverá ser feito nas varas onde tramitam os processos, após o prazo de sessenta dias da notificação do credor, conforme o procedimento praticado hoje para as chamadas Requisições de Pequeno Valor (RPV).
“São 86 artigos e vários parágrafos e incisos. Foi um longo trabalho que, no geral, atende as expectativas. Não é uma obra pronta pois certamente deverá ser melhorada com o uso, mas vai nortear o trabalho dos setores de precatórios de tribunais de todo o país, esclarecendo como devem ser feitos os pagamentos das precatórios e demais requisições judiciais”, destacou o conselheiro Luciano Frota, que preside o Fórum Nacional de Precatórios (Fonaprec), órgão do CNJ que estudou e elaborou a minuta da Resolução.
A nova resolução prevê o início de sua vigência para o dia 1º de janeiro de 2020, permitindo que sejam produzidos a partir dela efeitos concomitantes com o início do ano de execução orçamentária. Até a entrada em vigor da nova resolução, continuam valendo as normas de cada tribunal para o pagamento dos precatórios, baixadas conforme a interpretação de cada Corte sobre as normas constitucionais. Por essa razão, a maior preocupação do grupo foi de uniformizar nacionalmente, respeitadas as peculiaridades de cada ramo de Justiça, o conjunto de procedimentos até então presentes na Resolução nº 115 do CNJ, que não consideravam, por falta de atualização, as mudanças no tema trazidas pelas Emendas Constitucionais 94 e 95.
Índice de correção
Uma das novidades inseridas na nova Resolução é a padronização dos índices de correção monetária dos precatórios. O documento traz uma tabela informando os índices que devem ser aplicados ao crédito requisitado ao longo do tempo de espera de seu pagamento, segundo as leis vigentes em cada período calculado. A falta dessa previsão na Resolução 115 acabava causando disparidade entre tribunais, no cálculo dos saldos corrigidos de precatórios de uma mesma natureza. O valor de determinado precatório em processamento perante um tribunal de Justiça de um estado, por exemplo, era diferente daquele apurado em outro TJ, mesmo se de valores originalmente idênticos, e em créditos da mesma natureza.
Ainda sobre os cálculos dos débitos, a resolução definiu o chamado “erro material”, causa geradora do surgimento de precatórios com valores considerados “irreais”, e ainda estabelece critérios mais precisos para o processamento dos pedidos de impugnação e revisão da conta de atualização. “Procuramos tornar esses critérios mais minuciosos, explicado o passo a passo do processo de revisão da conta feita pelo juiz, nos casos de erro material, à vista da legislação e da jurisprudência dos tribunais superiores”, explicou o conselheiro Luciano Frota.
A Resolução esclarece ainda que o procedimento de substituição do credor falecido por seus sucessores não é de responsabilidade do presidente do Tribunal, e sim uma medida processual, regrada pelo Código de Processo Civil.
Também foi detalhado na norma como deve ser feito o processamento e registro das cessões, penhoras e compensações, tendo como objeto os créditos dos precatórios.
Pequenos valores
O normativo ainda trata, de forma específica, da liquidação dos chamados “pequenos valores”, aos pagamento dos quais não se aplica a expedição de precatório.
De acordo com o conselheiro do CNJ, o objetivo do Fonaprec foi de garantir que esses montantes fossem corretamente processados conforme o Código de Processo Civil, que prevê que o pagamento deve ser feito em até 2 meses (60 dias) da requisição ao ente.
O limite para tais pagamentos é definido por lei da entidade devedora, e não pode ser menor que o teto das obrigações do INSS.
Spread
Um dos temas mais debatidos durante a sessão foi a questão da remuneração que os tribunais estão autorizados a colher junto às contas especiais para pagamento de precatórios, chamado spread das aplicações financeiras dos recursos destinados ao pagamento dos precatórios. A proposta do Fonaprec veio no sentido de que esse dinheiro fosse usado para pagar precatórios, sendo revertido seu valor às contas especiais.
No entanto, o conselheiro Luiz Fernando Tomasi Keppen alertou para a possibilidade de desenquadramento dos tribunais à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) uma vez que muitos utilizam esses valores para pagamento de despesas de custeios e investimentos. “Teríamos um impacto avassalador nas contas dos tribunais, com uma perda de cerca de 12,2% do orçamento. É de extrema importância que os recursos continuem indo para os fundos especiais e que possam ser usados pelos tribunais”, destacou Keppen. A divergência, no sentido de deixar livre o tribunal para decidir o que fazer com tais recursos, foi acompanhada pela maioria dos Conselheiros do CNJ e a mudança foi incluída na proposta.
Legislação
Precatórios são requisições de pagamentos decorrentes da condenação de órgãos públicos e entidades governamentais em processos nos quais não há mais possibilidade de apresentação de recurso contra a sentença. A importância do tema é dada, em boa parte, pela magnitude das cifras envolvidas. De acordo com estimativas do Fonaprec, os precatórios a serem pagos por estados e municípios somam atualmente R$ 141 bilhões.
Segundo a Constituição Federal, a quitação dos precatórios deve obedecer a ordem cronológica, devendo primeiramente serem pagos os de natureza alimentar, e depois os não-alimentares. Já o pagamento das chamadas requisições judiciais de pagamento das obrigações de pequeno valor (RPVs) está regulamentado no novo Código de Processo Civil (CPC) e nas legislações que tratam dos juizados especiais fazendários, sendo realizado pelo juiz de 1º grau.
Em 2015, o STF definiu que o acervo da dívida, ou seja, aqueles precatórios pendentes de pagamento até 25 de março de 2015, deveriam ser quitados até 31 de dezembro de 2020. A decisão foi ratificada na Emenda Constitucional nº 94/2016, que também determinou que cada devedor estabelecesse um plano de pagamento dos precatórios pendentes, a ser executado, se de acordo com as regras constitucionais, pelo presidente do Tribunal de Justiça. A ausência do plano, sua desconformidade com a Constituição, ou seu descumprimento pelo devedor pode resultar no sequestro de valores das contas do ente público, dentre outras sanções, inclusive responsabilização do chefe do Poder Executivo por ato de improbidade administrativa.