Ao apreciar ação ordinária, ajuizada pela Associação dos Escrivães de Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Norte (Assep/RN) e pela Associação dos Delegados de Polícia Civil do Rio Grande do Norte (Adepol/RN), a 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal indeferiu o pedido de concessão de liminar para determinar a suspensão dos efeitos da Portaria Conjunta nº 33/2020-TJ, de 22 de junho de 2020. A norma institui procedimentos específicos para o cadastramento e a tramitação de feitos criminais no sistema Processo Judicial Eletrônico (PJe), no âmbito do primeiro grau de jurisdição do Poder Judiciário Estadual.
Ao examinar o procedimento previsto na Portaria, o juiz Francisco Seráphico Nóbrega, observa que o conteúdo do ato normativo, de modo diverso do que se argumenta na ação, não envolve a criação de novas atribuições para os servidores da Polícia Civil (especificamente, aos Delegados e Escrivães), mas sim, busca a otimização da tramitação processual e redução de custos, com a expansão do Processo Judicial Eletrônico (PJe), principal ferramenta para tramitação processual no Judiciário Brasileiro desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, para os procedimentos e processos criminais.
Dentre as determinações da Portaria, em seu artigo 3º existe a previsão de que o cadastramento de feitos criminais no Sistema PJe será feito diretamente pelos usuários da Polícia Civil, no âmbito de suas atribuições, mediante o uso de certificado digital. “Com a adoção do PJe, estima-se que a tramitação e o acesso aos Inquéritos Policiais seja instantânea, o que confere melhorias na celeridade, controle e segurança”, destaca o magistrado. “No mesmo sentido, a utilização do sistema reduz a utilização de papel e impressões pelo órgão, o que repercute em economia de recursos públicos com redução de gastos no uso de viaturas para o transporte de documentos por meio físico”, reforça.
Portaria unifica sistemas
“Desse modo”, ressalta o julgador, “a (i) instauração de inquéritos policias e demais procedimentos que se iniciem na Polícia Judiciária; (ii) prestação, à autoridade judiciária, de informações necessárias à instrução e ao julgamento dos processos penais; (iii) realização de diligências requisitadas pelo Juízo Penal ou Ministério Público; e (iv) ter sob sua responsabilidade inquéritos policiais, termos circunstanciados de ocorrência, processos penais, além de quaisquer outros procedimentos policiais e penais que estejam sob a sua guarda, entre outros, já constituem atribuições legais previstas para os cargos de Delegados e Escrivães da Polícia Civil, nos termos da Lei Complementar Estadual nº 270/04”.
O titular da 6ª Vara da Fazenda Pública de Natal ressalta que o objetivo da portaria é expandir o uso do PJe, com unificação de sistemas e centralização do fluxo de informações, permitindo ao Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e demais órgãos que compõem o sistema de justiça, entre os quais insere-se a Polícia Civil, à qual incumbe a função de Polícia Judiciária, conforme estabelece o art. 114, § 4º, da Constituição da República de 1988, a utilização de um sistema de informação comum.
Lembra o juiz, ao julgar o pedido, que a portaria estabelece que, enquanto não houver o treinamento dos usuários da Polícia Civil em cada Delegacia de Polícia, “a Direção do Foro de cada Comarca pode optar por receber procedimentos criminais por e-mail e o cadastro no Sistema PJe será realizado pelos servidores do Poder Judiciário”, salienta o magistrado.
Ao se manifestar nos autos, o Estado do Rio Grande do Norte contestou a afirmação das entidades sobre a migração para o PJe de inquéritos e procedimentos ser medida arbitrária e unilateral, sem qualquer consulta aos Policiais Civis do Estado. Para embasar a declaração do Poder Judiciário, há a juntada de diversas atas de reuniões conjuntas (ID 61342337, 61342338, 61342340, 61342341, 61342342, 61342343, 61342345, 61342346, 61342347 e 61342348), em que se verifica ser uma discussão antiga e com participação da Polícia Civil.
Alegações das associações
No pedido, os representantes dos escrivães e dos delegados relataram que em 22 de junho de 2020, o Tribunal de Justiça editou a Portaria Conjunta nº 33/2020, que institui procedimentos específicos para o cadastramento e a tramitação de feitos criminais no Sistema Processo Judicial Eletrônico (PJe), no primeiro grau de jurisdição da Justiça Estadual.
Alegaram ainda que o ato normativo atribui competência estranha aos policiais civis, em especial aos escrivães e delegados. Defenderam que não é da competência do presidente ou do corregedor-geral do TJRN atribuir competências suplementares aos membros da Polícia Civil. Para as entidades, o cronograma imposto pelo TJRN foi elaborado de forma unilateral e arbitrária, sem nenhuma consulta aos policiais civis, cujo ambiente de trabalho é carente de infraestrutura básica para atender à desmanda solicitada pelo Tribunal.
Na análise do caso, o juiz destacou que por meio do Ofício nº 003/CGPJe (ID 59075282 – p. 02), foi fornecido, pelo Poder Judiciário, link de acesso a treinamento destinado aos Delegados e Escrivães de Polícia Civil para utilização do sistema, destacando a disponibilidade de contato com servidores do Poder Judiciário dos setores responsáveis pela manutenção do sistema, em caso de necessidade. “Quanto a este ponto, é inviável a realização de treinamento de pessoal na forma presencial diante da atual conjuntura, tendo em vista a necessidade de cautela e permanência de medidas de isolamento social decorrentes da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19)”, frisa a decisão.
(Ação Ordinária nº 0839312-52.2020.8.20.5001)