Apesar de reconhecer a existência de interesse do devedor fiduciante na prestação de contas quando o bem objeto da garantia fiduciária é vendido, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ressaltou que essa pretensão não pode ser exercida no âmbito da ação de busca e apreensão.
Com esse entendimento, o colegiado negou o pedido do espólio de uma mulher para que fosse exigida a prestação de contas por parte de um banco, o qual, após ajuizar ação de busca e apreensão, obteve decisão favorável para rescindir o contrato de alienação fiduciária de veículo e consolidar a propriedade do bem.
O espólio recorreu ao STJ depois que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) decidiu que a prestação de contas só seria possível por meio de ação própria. No recurso, o espólio argumentou que seria possível a efetivação da prestação de contas nos próprios autos da ação de busca e apreensão, não havendo necessidade de ajuizamento de ação autônoma para tanto.
Dois caminhos
A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que, nas hipóteses de inadimplemento ou mora nas obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária, são duas as ações asseguradas ao credor fiduciário para a satisfação do crédito: a ação de busca e apreensão do bem (artigo 3º do Decreto-Lei 911/1969) e a ação de execução, cujo objetivo é o pagamento da integralidade da dívida (artigos 4º e 5º, do DL 911/1969).
Ao citar precedentes, a ministra lembrou que o STJ já decidiu que as ações de busca e apreensão e de execução não podem ser ajuizadas concomitantemente. Se o credor optar pela busca e apreensão – afirmou –, uma vez apreendido o bem, será promovida a sua venda extrajudicial, como dispõe o artigo 2º do DL 911/1969.
“Efetivada a venda, apura-se o saldo entre o produto da venda e o montante da dívida e encargos, procedendo-se à prestação de contas ao devedor; havendo sobra, o credor deverá entregá-la ao devedor, ou, ao contrário, remanescendo saldo devedor, o devedor continua responsável pelo pagamento”, disse.
Processo autônomo
Segundo a ministra, o interesse do devedor fiduciante é evidente nos casos de alienação extrajudicial do bem, uma vez que a solução dada pelo credor fiduciário afeta o seu patrimônio.
No entanto, ela observou que as questões sobre venda extrajudicial, imputação do valor alcançado no pagamento do débito e apuração acerca de eventual saldo remanescente em favor do devedor não podem ser discutidas incidentalmente na ação de busca e apreensão, cujo objetivo é tão somente a consolidação da propriedade do bem no patrimônio do credor fiduciário.
A ministra ressaltou que o próprio DL 911/1969, expressamente, define que a busca e apreensão constitui processo autônomo e independente de qualquer procedimento posterior.
Em seu voto, Nancy Andrighi citou precedente da Quarta Turma no qual se definiu que “não há possibilidade de alcançar essa prestação de contas no próprio âmbito da ação de busca e apreensão”, pois, além do fato de que essa ação se limita ao aspecto possessório, visando a consolidação da propriedade, “não há título executivo a amparar eventual cumprimento de sentença a respeito do saldo remanescente”.
Leia o acórdão.