O Ministério Público Federal (MPF) emitiu uma recomendação à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para que adote providências que garantam o devido atendimento das crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), conhecido como autismo, pelo plano de saúde Unimed Natal. A operadora cortou o atendimento que era feito a essas crianças em ambiente escolar e domiciliar, parte fundamental do tratamento.
O autor da recomendação, o procurador da República Camões Boaventura, criticou o fato de o corte promovido pelo plano de saúde, “abruptamente”, prejudicar severamente as terapias adotadas pelos médicos através da Análise Aplicada do Comportamento (ABA) e do método Denver de Intervenção Precoce.
“O tratamento mais adequado para o autista cabe exclusivamente ao médico e não ao plano de saúde, de modo que o convênio não pode interferir no tratamento necessário ao desenvolvimento mental e social do indivíduo diagnosticado com o Transtorno do Espectro Autista, tendo a operadora de saúde, diante da prescrição médica explicita, a obrigação de cobrir a todas as terapias recomendadas”, resume o representante do MPF.
Omissão – A Unimed Natal alega ter se baseado em uma legislação da Saúde Suplementar (Lei nº 9.656/98) e no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS, que não prevê a cobertura assistencial em ambiente escolar e domiciliar. O MPF alerta, contudo, que a jurisprudência aponta o rol de procedimentos como algo “exemplificativo e não taxativo, ou seja, que se o tratamento for prescrito pelo médico e o plano cobrir a doença, síndrome ou transtorno, tem-se o dever de cobrir o tratamento conforme indicação médica mesmo se não estiver listado”.
A agência também já derrubou, em todo o Brasil, o limite no número de cobertura para sessões de psicoterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia para os indivíduos com Transtorno do Espectro Autista, reforçando o entendimento de que esse tratamento deve ser fornecido conforme requisição médica.
Medidas – A recomendação do MFP requer da ANS o envio de ofício à Unimed Natal “esclarecendo que o profissional de saúde possui a prerrogativa de indicar a conduta mais adequada da prática clínica (…), orientando nesse sentido que a operadora de saúde retome com urgência a oferta de terapia aos usuários com Transtorno do Espectro Autista em ambiente natural, tais como escola e domicílio, conforme orientação médica para cada caso”.
O documento solicita ainda que a agência altere a Resolução n° 428/17, ou publique uma nova no prazo de até 180 dias, suprindo a omissão quanto à falta de protocolos clínicos específicos e eficazes para o tratamento dos usuários dos Planos Privados de Saúde acometidos do TEA, com base nos tratamentos internacionalmente reconhecidos.
Muitas reclamações de familiares das crianças clientes da Unimed Natal já chegaram ao conhecimento do MPF e também se transformaram em ações na justiça. A adoção das medidas recomendadas, por parte da ANS, podem vir a superar a possível insegurança jurídica decorrente de decisões diferentes.
TEA – O Transtorno do Espectro Autista, conhecido como autismo, é um conjunto de condições que resultam no comprometimento da capacidade socialização, comunicação, linguagem e interesse de um indivíduo, bem como que tais condições passam a se expressar ainda na infância e tendem a persistir durante a adolescência e a vida adulta, sendo importante que a pessoa com TEA tenha acompanhamento médico desde cedo.
Cada indivíduo dentro do espectro apresenta um conjunto de sintomas com características e intensidades bem variadas, de modo que tanto o diagnóstico, quanto o tratamento, devem ser personalizados de acordo com as particularidades de cada caso, sendo fundamental para o desenvolvimento e qualidade de vida do autista o tratamento multidisciplinar realizado por profissionais especializados, em ambiente clínico e também nas escolas e residências, conforme prescrição médica.
Esse tratamento geralmente associa médicos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, psicólogos, terapeutas ocupacionais e pedagogos para ajudar o paciente a cumprir tarefas simples e desenvolver a sociabilidade. A demora no início do tratamento, bem como a suspensão de etapas do mesmo, podem resultar em prejuízos para o desenvolvimento da criança, daí a preocupação do Ministério Público Federal.
Confira a íntegra da recomendação.