A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do RN, à unanimidade de votos, negou recurso interposto pelo Município de Natal e manteve sentença proferida pela 2ª Vara da Infância e da Juventude de Natal, a qual havia determinado que a prefeitura concedesse a uma adolescente o benefício do aluguel social.
Órfã, a adolescente é carente de recursos financeiros e mora em um lar de acolhimento em Natal. Ela identifica-se como mulher transexual e adota nome social, apesar ainda não ter alcançado, judicialmente, a desejada retificação de seus documentos, ganhou, na Justiça estadual, o direito de receber o benefício do aluguel social, no valor de um salário-mínimo, pelo período de seis meses.
O caso
A autora foi assistida juridicamente pela Defensoria Pública e relatou nos autos que é filha de pais falecidos, o que motivou seu acolhimento institucional, desde dezembro de 2015. Porém, a adolescente está prestes a atingir a maioridade civil, circunstância que implica em seu desligamento compulsório do acolhimento institucional.
Diante disso, a Defensoria Pública defendeu que é imperioso que a jovem não seja abandonada à própria sorte, sem qualquer amparo institucional, especialmente após todos os anos de assistência e apoio que obteve no acolhimento, associada a omissão do ente público, até o momento, sem qualquer iniciativa voltada para as repúblicas.
Defendeu que a ausência de políticas públicas destinadas à assistência de jovens recém-egressos do sistema de acolhimento institucional é um problema que já se prolonga por algum tempo, trazendo apreensão à adolescente, aos seus tutores e a toda a sociedade, razão pela qual ela pleiteou em juízo tal assistência, na forma do valor de um salário-mínimo mensal à título de aluguel social, não lhe restando qualquer outra opção digna de sobrevivência, pelo menos, até que possa firmar-se profissionalmente.
Recurso
A jovem obteve a sentença favorável na primeira instância, o que fez com que o Município de Natal recorresse ao TJRN. No recurso, afirmou que a autora postulou em primeiro grau o recebimento do benefício de “aluguel social” (auxílio-moradia), no valor de um salário-mínimo mensal e que a pretensão não encontra amparo legal, posto que a legislação municipal não prevê este benefício.
Defendeu que o programa previsto na Lei Municipal nº 6.473/2014 (com as alterações da Lei n. 6.545/2015) contempla apenas pessoas vítimas de situações emergenciais e de calamidade pública no âmbito do Município e como a adolescente não se enquadra em qualquer das hipóteses normativas previstas de forma taxativa na Lei Municipal n. 6.473/2014, não faz jus ao benefício.
Voto
Com base na Constituição Federal, no Estatuto da Juventude (Lei nº 12.852/13) e na Lei Municipal 6473/2014, o relator do recurso, o juiz convocado Eduardo Pinheiro decidiu que assiste razão as alegações da Defensoria Pública na defesa do direito da adolescente ao benefício postulado e conquistado em juízo de primeiro grau.
No caso, o magistrado entendeu que, apesar da alegação do ente público municipal de que não houve o preenchimento dos requisitos formais da Lei nº 6.473/2014, a sua finalidade maior foi preenchida, que é o resguardo da dignidade da pessoa humana.
“Desta forma, verifica-se correta a aplicação do benefício denominado ‘aluguel social’, de caráter excepcional, embora não esteja diretamente previsto para a hipótese dos autos, mas que pode ser estendida diante do grave quadro apresentado e da necessidade de garantia do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana”, concluiu.