É inegável que há, no Brasil, um racismo arraigado às estruturas sociais, fruto de mais de três séculos de escravidão que fomentaram a exploração espúria dos negros, constituindo-se, senão a maior, em uma das maiores máculas desta pátria.
Da mesma forma, não se pode fechar os olhos aos esforços do povo brasileiro em combater este mal. A própria Constituição Federal de 1988 repudiou o racismo em todas as relações internacionais (art. 4°, VIII) e o alçou à condição de crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão (art. 5°, XLII), tendo sido regulado pela Lei n° 7.716/1989.
Neste diploma legal, o racismo foi tipificado como um crime contra a coletividade, dirigido indistintamente a todos da raça negra, como ofensas genéricas ou incitação à discriminação, proibição de acesso a estabelecimentos comerciais ou elevador social de um prédio, dentre outros, puníveis com reclusão de 1 a 5 anos.
Além do arcabouço legal, muitas políticas afirmativas têm diminuído as desigualdades e a segregação racial, ampliando a possibilidade de crescimento deste povo que, com suas mãos, ajudou a moldar os valores e sabores brasileiros.
Algumas dessas políticas garantiram quotas para ingresso nas Universidades, programas especiais de emprego e a determinação, emanada pelo Tribunal Superior Eleitoral, de rateio proporcional dos recursos para candidatos negros e pardos.
É importante lembrar que, mesmo antes disso, muitos negros conquistaram, em diversas áreas, proeminência na sociedade. Machado de Assis, na literatura; Pelé, no futebol; Grande Otelo, na comédia; Lázaro Ramos, na dramaturgia; Milton Nascimento, na música; Joaquim Barbosa, no Direito, são apenas alguns exemplos de negros que, com esforço e determinação, superaram os inúmeros óbices e se destacaram positivamente no país.
E isto não é algo raro no Brasil. Eu, particularmente, tenho orgulho de ter amigos negros e pardos que mudaram a história de suas famílias, como a de José Carlos Justo, um dos 8 filhos de uma dona de casa e de um soldado do EB reformado, que, por mérito próprio, foi promovido ao oficialato superior do Exército Brasileiro, ocupando cargos de relevo por onde passou.
Estas exceções terminam por regar a teoria de que, no Brasil, o preconceito é social e, não, racial, ante a escorchante concentração de renda que gerou uma fossa abissal entre pobres e ricos, o que é uma meia verdade, pois, por origem, a questão racial está umbilicalmente ligada à social.
Tecidas estas considerações, podemos concluir que só há racismo se houver uma intenção subjacente de segregação de indivíduos por causa de sua raça e, não, por qualquer outra motivação individual e subjetiva da vítima.
No caso João Alberto, o ato perpetrado pelos seguranças foi odioso, cruel e desproporcional, devendo ser processados e punidos de forma exemplar.
Ocorre que, independentemente de ter sido ancorado no racismo ou não, que as investigações irão definir, a motivação deste crime brutal também foi produto da intolerância e violência que ora embarcaram nas relações humanas brasileiras.
Estamos perdendo o poder de diálogo. Vivemos em um país onde quem pensa diferente é encarado como inimigo e alvo de ataques injustos, olvidando-nos de que somos um povo pacífico, hospitaleiro e generoso.
Porque afrontam a nossa essência, a polarização das ideias, a politização das questões sociais e a proliferação das notícias falsas são o novo desafio do povo brasileiro, sendo imperativo o seu combate com o oposto: diversidade, tolerância e verdade.
Por fim, a vasca da violência que levou João Alberto da vida é injustificável, independentemente do que a chamem. Violência não precisa de sobrenome para nos fazer chorar.