“Ser ou não ser, eis a questão”. A célebre frase do protagonista da peça “A tragédia de Hamlet”, de Sheakspeare, define bem a atual postura do Judiciário Brasileiro, ao prolatar decisões vacilantes e contraditórias, gerando um estado de extrema insegurança jurídica.
O chamado ativismo judicial, que é a atuação extensiva do Poder Judiciário ao adequar, inovar ou modificar a lei através da sua interpretação, já vem de longa data, pois surgido nos EUA, em 1947, e aportado nas terras brasileiras, depois da redemocratização e da Constituição de 1988.
Foi esta prática do Judiciário que, ao apresentar resposta às demandas que, originariamente, deveria partir dos outros dois Poderes (Executivo e Legislativo), propiciou o surgimento de outro fenômeno: o da judicialização da política, que nada mais é do que a transferência das competências destes Poderes para o Judiciário, ao arrepio do princípio constitucional da separação dos Poderes.
Dessa forma, a cultura do litígio e demandas crescentes assoberbaram as unidades judiciárias de todo o país, que, sem estrutura e pessoal, não conseguem entregar a prestação jurisdicional em um tempo razoável (um processo dura, em média, de 6 a 8 anos, segundo dados do CNJ – Conselho Nacional de Justiça – de 2019).
Ocorre que, com a pandemia de covid-19, as demandas judiciais ganharam contornos ainda mais trágicos. Na tentativa de frear o contágio do coronavírus, proliferaram atos do Executivo que estabeleceram normas variadas, desde a obrigatoriedade da máscara, o distanciamento social, o toque de recolher até o lockdown, conforme o viés político de cada governante.
Não obstante o teor mais ou menos severo dos decretos, o Judiciário passou a revisá-los diuturnamente, causando uma grave insegurança jurídica, uma vez que não se sabia mais qual decreto valia (o Estadual ou Municipal) ou se determinada norma de um decreto valeria para todos, já que há decisões contraditórias dentro do mesmo tribunal, a exemplo da polêmica da abertura ou não das academias em relação ao último Decreto de lockdown do Estado do RN.
Sabe-se que é uma questão de política parar ou não um município, um Estado ou um país, sendo, portanto, prerrogativa do governante legitimamente eleito pelo povo que se identificou com seus valores, sendo este responsável na condução política dos governados rumo ao bem-estar social e felicidade.
Consequentemente, decidir se o governante tomou a melhor medida, ressalvando-se os casos de evidente abuso, é se enfronhar no âmbito político, avocando para si a responsabilidade de tal decisão que, da mesma forma, trará consequências à parcela da sociedade, o que não é papel do Judiciário.
Embora haja essa clareza de entendimento, infelizmente, alguns magistrados têm validado toque de recolher inconstitucional, permitido que normas locais se sobreponham às Federais e decidido qual segmento é ou não essencial, dentre outras decisões absurdas proferidas em todos os Estados da Federação, apesar de revestidas de excelentes intenções.
Na prática, o Poder Judiciário passou a ser um superpoder, ditando, segundo valores de alguns magistrados, a última palavra em todas as questões políticas, sociais e econômicas no país, sem, contudo, submeter-se à responsabilidade de suas decisões, cujo teor não poderão ser contestadas fora do próprio Judiciário, ou mesmo ao crivo do eleitorado dentro de um processo eleitoral.
Por outro lado, não se concebe um Estado Democrático de Direito sem o Poder Judiciário, sendo imprescindível para a manutenção da ordem constitucional e, principalmente, das garantias fundamentais e liberdades individuais.
Assim, o que se espera do Judiciário é uma serena interpretação da lei e um julgamento justo dos conflitos da sociedade, longe da influência de qualquer clamor, interesse ou política, pois, parafraseando Cícero, Justiça extrema, ou sem o facho luminoso da lei, é só injustiça.