A Convenção para eliminação de todas as formas de violência contra as mulheres, celebrada em 1979 pela Organização das Nações Unidas (ONU), define “discriminação contra mulher” como “toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher”. No entanto, mesmo incorporada ao direito interno pelo Decreto nº 4.377/2002, e passados 12 anos da promulgação da Lei Maria da Penha, considerada referência no plano das leis de proteção às mulheres em todo mundo, o desafio consiste em superar as resistências culturais e proteger as mulheres das mais variadas formas de discriminação, entre elas, a violência doméstica e o feminicídio.
Nesse contexto, o Programa de Formação Continuada para Magistrados realizou, nos dias 31 de outubro e 1º de novembro, o curso “Gênero, acesso à justiça e violência contra as mulheres”, voltado para juízes e servidores que atuam nos Juizados Especiais de Violência Doméstica, Cejusc e demais unidades que recebem ações dessa matéria.
O curso foi ministrado pela formadora da Enfam, Adriana Ramos de Mello, juíza do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Poder Judiciário do Rio de Janeiro (TJRJ). A capacitação trabalhou questões de conceito de gênero, na forma do tratamento que deve ser dispensado à mulher em violência, conceito sobre patriarcado, direitos humanos, pontos voltados para explicitar a forma com que o Judiciário precisa entender essa perspectiva para lidar com o julgamento desses casos de forma mais livre possível de esteriótipos e preconceitos.
“As mulheres estão procurando, cada vez mais, o Poder Judiciário e é importante que os juízes saibam como acolhê-las sob uma perspectiva de gênero e de direitos humanos. É preciso motivar e empoderar as mulheres, porque é uma decisão difícil, ir a uma delegacia de polícia, relatar a violência e precisamos estar capacitados e sensibilizados pra atendê-las de forma eficaz e humana”, explicou a juíza Adriana Ramos de Mello.
A docente ressaltou que o curso é dinâmico e traz uma metodologia ativa, com estudos de caso e uso da técnica de storytelling nas atividades em grupo, promovendo assim um exercício de imersão em cada um dos alunos, ao provocar o uso da criatividade e técnicas para construção de narrativa, tendo como foco apresentar soluções (desfecho) para o conflito (problemática) e assim escrever a história de mulheres que sofreram violência, buscaram a justiça e tiveram acolhimento.
Neste curso, também foi apresentado o formulário nacional de avaliação de risco de violência e feminicídio, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), através da Resolução nº 284/2019, que cria mais um instrumento para avaliação do risco desse tipo de violência.
De acordo com a juíza Cristiane Batista, titular da 1ª Vara da Comarca de Macau, a capacitação trouxe fatores do dia a dia das comarcas. “Diariamente recebemos pedido de medida protetiva de urgência e prisão em flagrante, por isso, debater o tema, trocar experiências é fundamental. Levarei a prática do formulário de avaliação de risco do CNJ para a comarca, para ter um panorama amplo das circunstâncias e fixar as medidas protetivas de uma forma segura e eficaz”, relatou.
Ações
O tema do curso foi solicitado pela Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência (CE-Mulher), que tem o juiz Deyvis de Oliveira Marques como responsável. O magistrado explicou que esse assunto é indissociável da capacitação dos profissionais da área. “A temática exige um olhar sensível, diferenciado e um trabalhado em rede, que envolva assistentes, a secretaria e também as equipes multidisciplinares”.
Deyvis Marques frisa a constante preocupação do Poder Judiciário do RN com a situação de violência destas mulheres, ao criar medidas para o enfrentamento da questão, como a Meta Nísia, para agilizar os processos dessa área; as capacitações realizadas pela Esmarn; a abertura do Tribunal para criação de estágios nas áreas de psicologia e serviço social; a criação de novos Juizados especializados em violência contra mulher, totalizando cinco no Estado; e na atual gestão da Presidência do TJ e Corregedoria de Justiça, a criação e regulamentação do sistema de intimação das vítimas por WhatsApp, que permite ao juiz, logo após aplicar a medida protetiva, enviar a decisão por meio deste aplicativo, desde que a vítima tenha assinado termo solicitando e autorizando que a intimação seja feita por essa modalidade.
Fonte: Portal do Judiciário