Em atenção aos princípios do Estatuto do Torcedor, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão da Justiça do Paraná que condenou o clube Athletico Paranaense a indenizar em R$ 20 mil por danos morais torcedores do Goiás Esporte Clube que, ao chegarem de carro para assistir a uma partida entre os dois times pelo Campeonato Brasileiro de 2014, foram cercados por torcedores do Athletico nas imediações da Arena da Baixada, em Curitiba, e tiveram o veículo depredado.
Na decisão, o colegiado considerou, entre outros fatores, que o episódio de violência ocorreu na área do estádio reservada para os torcedores do Goiás e que o clube paranaense não adotou todas as medidas necessárias para conter a invasão dos torcedores adversários e o cometimento dos atos de violência
“O clube mandante deve promover a segurança dos torcedores na chegada do evento, organizando a logística no entorno do estádio, de modo a proporcionar a entrada e a saída de torcedores com celeridade e segurança”, afirmou a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi.
Na ação de indenização – proposta pelo dono do veículo e por um dos torcedores que receberam o carro emprestado –, os torcedores do Goiás narraram que chegaram a uma rua sem saída, próxima à entrada destinada à torcida goiana. Na sequência, eles perceberam a aproximação de um grupo de torcedores do Athletico correndo na direção deles, e só tiveram tempo de abandonar o carro e entrar no estádio. Depois de depredarem o veículo, os paranaenses ainda conseguiram invadir o interior do estádio onde se abrigaram os torcedores do Goiás e só foram repelidos por policiais militares.
Após a condenação por danos materiais e morais ter sido mantida pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), o Athletico Paranense argumentou, em recurso especial, que a responsabilidade pela vigilância das vias públicas é do Estado, que o faz por intermédio da Polícia Militar. Nesse sentido, o clube alegou que não poderia ser responsabilizado pelo episódio, tendo em vista que a agressão ocorreu em local público, fora do estádio e horas antes do início do jogo.
Torcedores têm direito de proteção nos jogos
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, lembrou que o artigo 2º da Lei 10.671/2003 caracteriza como torcedor toda pessoa que aprecie, apoie ou se associe a qualquer entidade de prática desportiva do país e acompanhe a prática de determinada modalidade. Já o artigo 3º do Estatuto faz remissão ao Código de Defesa do Consumidor e equipara a fornecedor a entidade responsável pela organização das competições – o que não deixa dúvidas, segundo a magistrada, da relação consumerista existente entre o torcedor e o clube.
Em relação à segurança nos estádios, a ministra apontou que o artigo 13 do Estatuto do Torcedor consagra o direito do torcedor à proteção nos locais onde são realizados os eventos esportivos antes, durante e após a realização das partidas. Essa previsão é completada pelo artigo 14 do Estatuto, que atribui à entidade detentora do mando de campo do jogo a responsabilidade pela segurança do torcedor, cabendo a ela uma série de medidas, como solicitar ao poder público a presença de agentes de segurança dentro e fora dos estádios.
“Vale ressaltar que a requisição da presença de força policial no local pelas entidades organizadoras não é suficiente para eximi-las da responsabilidade pela segurança do torcedor. Tal providência é apenas um dos deveres imposto pela lei à detentora do mando de jogo”, reforçou a relatora.
Segurança insuficiente oferecida pelo clube
No caso dos autos, Nancy Andrighi destacou que o TJPR, com base nas informações reunidas nos autos, concluiu que, embora o Athletico Paranense tenha providenciado a segurança do local e dos torcedores, as medidas adotadas não foram suficientes para impedir os episódios de violência cometidos por seus próprios torcedores.
“Sendo a área destinada aos torcedores do Goiás, o recorrente deveria ter providenciado a segurança necessária para conter conflitos entre adversários, propiciando a chegada segura dos torcedores daquela agremiação no local da partida. Mas não foi o que ocorreu, porquanto o reduzido número de seguranças não foi capaz de impedir a destruição do veículo”, disse a magistrada.
Ao manter o acórdão do TJPR, Nancy Andrighi ressaltou que a decisão não implica à aplicação da teoria do risco integral às instituições esportivas, ou seja, não se está afirmando que os clubes responderão por qualquer dano ocorrido no entorno do local da partida. Na verdade, apontou a ministra, cada situação deve ser analisada individualmente, a fim de se averiguar se houve problemas na segurança e se a situação tem relação com a atividade desempenhada pelo clube.