O adiamento das Eleições Municipais foi dabatido pelo presidente do TSE, Luis Roberto Barroso, em sessão promovida pelo Senado Federal nesta segunda-feira (22). A sessão foi presidida pelo senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator da PEC, que será votada na sessão plenária do Senado desta terça-feira (23). Além de Barroso, médicos, cientistas e especialistas em Direito Eleitoral – debateram com os parlamentares da Casa a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permite o adiamento das Eleições Municipais de 2020, em virtude da pandemia de Covid-19.
Após a abertura dos trabalhos, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que há um consenso médico no sentido do adiamento das Eleições Municipais deste ano por algumas semanas. Com base no posicionamento desses especialistas, ele informou que o TSE propôs aos presidentes do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), e ao relator da PEC o adiamento do pleito de 4 de outubro para uma “janela”, sugerida pelo médicos para o período de 15 de novembro a 20 de dezembro.
A data de realização das eleições seria uma escolha política do Congresso Nacional, enfatizou Barroso ao explicar o motivo pelo qual a Corte não sugeriu um dia específico. “Portanto, o TSE endossa o consenso médico da conveniência de se adiarem as eleições por algumas semanas para dentro dessa janela que está sendo considerada”, disse.
O presidente do TSE ressaltou que não convém aproveitar a emergência da pandemia para fazer mudanças estruturais no sistema eleitoral em vigor ou em datas de posse de cargos eletivos, devendo as mudanças ser concentradas em questões relacionadas à pandemia causada pelo novo coronavírus. Barroso solicitou que, ao apreciar a PEC, os senadores considerem a possibilidade de permitir ao TSE adiar, por ainda mais algumas semanas, as eleições, eventualmente já transferidas para novembro – embora sempre dentro do ano de 2020 –, em municípios em que isso precise ocorrer.
Mandatos e prazos eleitorais
O ministro destacou que há um entendimento – entre o TSE, os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados e o relator da proposta – pela não prorrogação dos mandatos municipais, a fim de evitar o enfrentamento de “problemas graves de natureza constitucional”.
Ele informou aos senadores que já expôs a esses parlamentares a necessidade de não se modificar os prazos eleitorais já transcorridos, especialmente os de filiação partidária, de domicílio eleitoral e de desincompatibilização para a disputa eleitoral de cargos de alto escalão. “E, sobretudo, para o TSE, seria um caos reabrir o cadastro eleitoral. Nós já estamos envolvidos em outras etapas das eleições e seria quase inviável para parar essa programação e voltar para o cadastro eleitoral”, alertou Barroso.
Barroso apontou que alguns prazos móveis poderiam ser postergados na mesma proporção de 42 dias, conforme sugerido pelo presidente do Senado Federal e pelo relator da PEC. São datas relativas ao horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e à convocação dos mesários, por exemplo.
Haveria, ainda, a prorrogação para três meses antes da eleição dos prazos de desincompatibilização de servidores municipais. Também seria alterada, pelo mesmo tempo de adiamento das eleições, a contagem para a vedação a determinadas condutas praticadas por agentes públicos, como a questão de repasses de convênios, a movimentação de servidores e a publicidade institucional.
Voto facultativo
Luís Roberto Barroso disse que, num mundo ideal, o voto será facultativo. Porém, segundo ele, no estágio atual da democracia brasileira, o voto, além de um direito do cidadão, deve ser também um dever cívico. “E nós temos muita preocupação de que a facultatividade possa produzir uma deslegitimação da classe política e dos eleitos, na eventualidade de um elevadíssimo índice de abstenção”, alertou.
O ministro salientou que deve ser considerada uma eventual anistia de multa para os eleitores que não puderem comparecer às urnas por fundado temor da ação do vírus, em razão de se enquadrarem em grupo de risco.
Preparação para as eleições
O presidente do TSE informou que a Justiça Eleitoral está preparando uma cartilha para as Eleições Municipais, com recomendações sobre o distanciamento social e de ordem sanitária, como de não levar a mão à boca, ao nariz e aos olhos, entre outros esclarecimentos. Disse, ainda, que a Justiça Eleitoral, em parceria com o Congresso Nacional, vai buscar doações com a iniciativa privada para o fornecimento, sem custo para os cofres públicos, de máscaras, álcool gel e luvas para aumentar a proteção dos mesários e dos eleitores.
Ao finalizar, Luís Roberto Barroso destacou que o maior objetivo do TSE é garantir Eleições Municipais seguras para todos. Ele lembrou que a saúde pública é o bem maior; contudo, é preciso preservar a democracia. “Portanto, os senhores fiquem tranquilos. Outros países realizaram eleições. Tudo o que de bom puder ser transplantado do que se fez em outras partes do mundo nós traremos para cá, para garantir uma eleição segura, limpa e que dê continuidade a esse longo período de estabilidade democrática”, assegurou o magistrado.
O vice-presidente do TSE, ministro Edson Fachin também participou do debate e exaltou o diálogo interinstitucional para tratar das Eleições 2020. “todos nós estamos na pandemia, cuidando da saúde e da democracia, e a Justiça Eleitoral está à disposição do Parlamento e da sociedade brasileira para operacionalizar a imprescindível convivência democrática no Estado Democrático de Direito.”
Cientistas
Antes da abertura dos debates entre os senadores, foi dada a palavra aos médicos Paulo Lotufo, epidemiologista da Universidade de São Paulo (USP), e David Uip, infectologista e presidente do Instituto Emílio Ribas, de São Paulo, além do biólogo virologista Átila Iamarino.
David Uip afirmou considerar inconcebível realizar o pleito na data estipulada pela Constituição Federal. Ele propôs que, além das proteções sanitárias para que o voto seja mais seguro, a eleição seja realizada o mais próximo possível do fim ano, com horário estendido no geral e, especificamente, com horários alternativos e apropriados para a população mais vulnerável (idosos ou portadores de doenças pré-existentes). “É necessário ainda um fluxo de sistemas bem planejado para que tenhamos a maior segurança possível tanto para os leitores quanto para os trabalhadores do processo eleitoral. Para isso, é necessário um treinamento efetivo para todos que se envolverão no pleito”, avaliou.
Paulo Lotufo, por sua vez, considerou que manter a eleição em 4 de outubro fará com que o Brasil tenha um aumento ainda maior de novos casos de Covid-19 e ainda mais mortes, bem como um nível muito alto de contágio. Ele propôs que a votação ocorra no dia 15 de novembro para o primeiro turno e no dia 15 de dezembro para o segundo turno, conforme sugeriu o presidente do TSE. “Acho essa data bem razoável. Uma das questões já acertadas, seja qual for a data, é que o período seja estendido por mais três horas”, acrescentou. Ele disse não ver a necessidade de alterar a regra da idade do voto facultativo, que hoje vale para os eleitores analfabetos, menores de 18 anos e maiores de 70 anos.
Último cientista a falar, Átila Iamarino afirmou que o Brasil está relaxando as medidas de isolamento social mais pelo cansaço e por necessidade econômica do que pelo controle da pandemia. Segundo o biólogo, o grande problema das eleições no contexto da pandemia é o deslocamento e a aglomeração das pessoas em virtude da votação. Ele destacou a importância de providências para diminuir essa aglomeração, seja com mais seções eleitorais, seja com a ampliação do horário de votação ou do número de dias em que a votação acontecerá.
Juristas
Também participaram da sessão plenária os juristas Henrique Neves da Silva, pelo Instituto Brasileiro de Direito Eleitoral (Ibrade); Marcelo Weick Pogliese, pela Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep); e Melillo Dinis, diretor no Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
Henrique Neves, ex-ministro TSE, destacou a importância do diálogo entre juristas, políticos e cientistas para se definir a questão da segurança da saúde dos eleitores nas Eleições Municipais de 2020. Ele disse acreditar que, por meio de emenda constitucional, é possível, diante do quadro excepcional, que se autorize à Justiça Eleitoral adotar as medidas que vierem a ser consideradas não simplesmente necessárias pela parte da saúde, mas tecnicamente viáveis.
O jurista Marcelo Pogliese compartilhou com os senadores os resultados dos estudos que a Abradep vem realizando sobre a questão das eleições no contexto da pandemia de Covid-19. Para ele, é importante que o pleito seja adiado para que se possa proteger a saúde da população e dos servidores da Justiça Eleitoral. Ele sugeriu a readaptação do calendário eleitoral em face do adiamento do dia da votação, como é o caso da data da realização das convenções partidárias e da análise das contas eleitorais, entre outros.
Por fim, o advogado Melillo Dinis explicou que, ao aprovar o adiamento das eleições, também se observem os prazos de inelegibilidade que são impostos na Lei da Ficha Limpa. Ele propõe que haja uma prorrogação das cláusulas de inelegibilidade a respeito da data da eleição. “Ou seja, a ideia é que o prazo, ou os prazos de inelegibilidade anterior ou relacionada com o pleito de 2020, cuja contagem tenha como referência a data da eleição, serão aferidos com base na data de 4 de outubro de 2020, claro, recepcionando aqueles que são os prazos naturais e normais”, explicou.
Debate
A sessão plenária prosseguiu com as exposições dos senadores inscritos, que fizeram diversas perguntas ao presidente do TSE e aos demais participantes convidados.