Instrumento basilar das políticas públicas educacionais brasileiras, o segundo Plano Nacional de Educação (PNE) está a pouco mais de um ano de encerrar sua vigência. O cenário é desolador: a maior parte das 20 metas não foram alcançadas, e mesmo as que foram apontam para uma realidade de estagnação ou retrocesso. Em breve, o governo federal terá de enviar ao Congresso Nacional um novo projeto de lei com o PNE para o próximo decênio — o atual (Lei 13.005, de 2014) finda sua vigência em junho de 2024. A nova proposta terá de repetir boa parte das metas não executadas na primeira e na segunda versões do plano, esta última muito prejudicada por cortes orçamentários e pela pandemia da covid-19 nos últimos três anos.
O senador Flávio Arns (PSB-PR) foi o presidente da Subcomissão Temporária para Acompanhamento da Educação na Pandemia, cujas atividades foram encerradas em dezembro de 2022. Ele entregou ao vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, o relatório final da subcomissão, que monitorou e avaliou os impactos da pandemia sobre a educação, bem como propôs 30 recomendações para a recuperação dos sistemas de ensino com vistas à formulação de uma agenda estratégica para os próximos anos.
— A primeira recomendação do relatório foi direcionada ao Ministério da Educação, nos seguintes termos: posicionar o Plano Nacional de Educação como elemento central do planejamento das políticas educacionais nos próximos anos, tanto no que se refere ao atual PNE quanto relativamente aos debates para a elaboração do novo plano — destaca Arns.
Ao longo de 15 meses de trabalho, a subcomissão ouviu em audiências públicas diversos especialistas e representantes de órgãos públicos e da sociedade civil. O PNE foi um tema constante nas falas dos convidados, em geral preocupados com sua evolução insatisfatória. O próprio Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável por publicar a cada dois anos um relatório de monitoramento das metas, reconhece que o nível de execução do plano é baixo.
— No referido relatório, o Inep revelou algo assustador: desconsiderando o avanço educacional que nós já tínhamos conseguido quando o PNE entrou em vigor em 2014, o nível de execução real do plano não passa de 40%, na mediana. A conclusão, infelizmente, é a de que os anos de vigência do PNE tiveram uma contribuição muito insatisfatória para o avanço da educação no país — ressalta o senador.
Ao definir ações, prazos e metas para as mais diferentes iniciativas educacionais, o PNE também é instrumento fundamental para os planos instituídos em estados e municípios. O PNE tem entre suas diretrizes propostas como a erradicação do analfabetismo; a universalização do atendimento escolar; e a superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação.
Para Tânia Dornellas, assessora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o Plano Nacional de Educação — como política de Estado — deve ser “a espinha dorsal, o epicentro dos programas, das políticas públicas, das ações educacionais, que devem ser construídos e implementados em cooperação, fortalecendo assim o pacto federativo”.
‘Coerção’ para gestores cumprirem metas
Os órgãos públicos e a sociedade civil precisam monitorar, controlar e fiscalizar melhor o Plano Nacional de Educação. Quem faz essa afirmação é Flávio Arns, que defende a instituição de mecanismos que confiram caráter de coercibilidade às metas do PNE, “de modo que as pessoas deixem de olhar o plano como uma simples carta programática ou um plano de intenções, e o vejam como uma lei com metas impositivas a todos, sob pena de consequências jurídicas aos responsáveis pela sua execução”.
— Precisamos pensar em regras de responsabilidade educacional para nortear a atuação dos nossos gestores públicos na área da educação, à semelhança da Lei de Responsabilidade Fiscal, que existe para preservar a saúde orçamentária e financeira do nosso país — argumenta Arns.
É nesse contexto que o senador apresentou recentemente um projeto de lei — o PL 88/2023 — que dispõe sobre a responsabilidade educacional na garantia de oferta e de padrão de qualidade na educação básica pública. O texto determina, entre outras medidas, que a qualidade e a oferta serão medidas e acompanhadas por indicadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb). Também prevê que o não cumprimento das metas do PNE poderá ser considerado improbidade administrativa e resultar em punições — inclusive como crime de responsabilidade no caso de prefeitos e governadores.
Consultor legislativo do Senado na área de educação, José Edmar de Queiroz também defende que o Poder Legislativo discuta um mecanismo para garantir maior coercitividade na implementação das metas do PNE.
— Talvez ele [o PNE] tenha tido pouca capacidade de obrigar os gestores e as redes de ensino a cumprir suas determinações. Infelizmente, ao contrário de outras legislações que são muito eficazes, “leis que pegam”, com o PNE não tem sido assim; é uma lei de fraca coercitividade — observa Queiroz.
Por outro lado, Tânia Dornellas não aposta na coerção, mas no fortalecimento da democracia participativa e no convencimento.
— A coerção não dialoga com o nosso propósito de fortalecimento da educação e da democracia participativa. Entendemos que o melhor caminho é o diálogo, é o convencimento de se investir na educação. O governo precisa pensar estrategicamente em quais ações ele vai investir para fortalecer o pacto federativo, e, ao mesmo tempo, fazer com que essas políticas públicas que foram fragilizadas, descontruídas nos últimos anos, possam voltar a ser ampliadas no âmbito da educação — diz a assessora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Confira as 20 metas do PNE e a avaliação do Inep sobre o cumprimento de cada uma
O Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 4/23 susta a criação da Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia na estrutura organizacional da Advocacia-Geral da União (AGU). O texto, em tramitação na Câmara dos Deputados, foi proposto pelo deputado Mendonça Filho.
A procuradoria nacional foi instituída pelo Decreto 11.328/23, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no dia da posse (1º de janeiro). O decreto trata da estrutura administrativa da AGU.
O novo órgão terá entre suas funções “representar a União, judicial e extrajudicialmente, em demandas e procedimentos para resposta e enfrentamento à desinformação sobre políticas públicas”.
Mendonça Filho afirma que a procuradoria foi criada sob o pretexto de promover o enfrentamento à desinformação sobre políticas públicas, mas pode servir de fundamento para a censura dos oposicionistas do governo.
“O vocábulo ‘desinformação’ possui um conceito bastante volúvel e contornável ideologicamente. Logo, deve haver uma discussão mais ampla sobre o assunto, que não pode ficar restrita às diretrizes do Poder Executivo, especificamente por meio da tutela da AGU”, explica.
A suspensão da criação da procuradoria especializada também motivou a apresentação dos PDLs 14/23, 22/23, 27/23 e 38/23, de autoria, respectivamente, dos deputados Caroline de Toni (PL-SC), Chris Tonietto (PL-RJ), Kim Kataguiri (União-SP) e Adriana Ventura (Novo-SP).
Tramitação
O PDL 4/23 será despachado para análise das comissões permanentes da Câmara.
Fonte: Agência Câmara de Notícias