É constitucional a previsão legal do Programa Mais Médicos de realização de chamamento público como requisito prévio à autorização do funcionamento de cursos de medicina. O entendimento é do procurador-geral da República, Augusto Aras, em manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela procedência de ação ajuizada pela Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup). A entidade requer a declaração de constitucionalidade do artigo 3º da Lei 12.871/2013, que exige a realização do procedimento para o funcionamento de cursos de medicina, tendo em vista a existência de decisões judiciais que obrigam o Ministério da Educação (MEC) a avaliar ou a deferir pedidos de autorização de cursos sem a realização do chamamento público previsto na norma.
Ao analisar a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 81, o procurador-geral da República destaca que o dispositivo é constitucional e está inserido em política pública direcionada a incrementar a qualidade da educação superior na área da saúde e a garantir melhor distribuição dos profissionais pelo território brasileiro. Aras sustenta que não há como conciliar o procedimento de chamamento público e a apresentação de pedidos individuais de autorização de funcionamento de cursos de medicina. Segundo o PGR, violar essa regra reduz o espaço de atuação do poder público na alocação desses cursos nas localidades que mais necessitam de incremento de recursos humanos nessa área.
Distribuição de profissionais – Augusto Aras explica que a Lei 12.871/2013 resultou da Medida Provisória 621/2013, que instituiu o Programa Mais Médicos e promoveu alterações na forma de atuação do poder público e das entidades de ensino no campo da medicina. Um dos objetivos da norma foi criar mecanismo de ação que permitisse ao poder público condução mais eficaz do processo de escolha das localidades em que seriam alocados prioritariamente os cursos de medicina.
Nesse sentido, foi estabelecida nova forma de autorização para o funcionamento especificamente desses cursos, com a obrigatoriedade – para o início do procedimento de autorização – da realização do chamamento público. De acordo com o artigo 3º da Lei 12.871/2013, o procedimento deve ser conduzido pelo Ministério da Educação, para que sejam pré-selecionados os municípios em que serão ofertados os cursos.
Em outro trecho do parecer, Augusto Aras alerta que a não observância dos requisitos da Lei 12.871/2013 “tem potencial de interferência nos dados relacionados ao quantitativo de médicos e futuros médicos com atuação em determinada região, com prejuízo certo à política que intenta distribuição territorial mais justa desses profissionais”. Portanto, segundo ele, não parece compatível com a norma permitir-se que o poder público promova a autorização para o funcionamento de cursos de medicina por outro meio.
O procurador-geral destaca ainda que o dispositivo em análise respeita o princípio da isonomia, uma vez que garante que qualquer instituição de ensino participe dos chamamentos públicos, em igualdade de condições com as demais, desde que as exigências e critérios legais sejam obedecidos. O PGR também afasta afronta à livre iniciativa, fundamento usado para autorizar o funcionamento dos cursos sem o chamamento público. De acordo com Aras, admite-se a redução da liberdade econômica para promover a maximização de valores constitucionalmente assegurados em relação a parcela significativa dos cidadãos.
Por fim, o procurador-geral da República acrescenta que, afastados os vícios, não cabe ao Poder Judiciário a valoração do conteúdo da política pública em exame. “Tal materialidade está inserida no espaço de atuação conferido pela Constituição ao legislador, que fica imune, nessa extensão, ao controle jurisdicional”, observa.