Candidata a presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio Grande do Norte (OAB-RN), a advogada Rossana Fonseca diz estar preparada para a responsabilidade de presidir a instituição e cuidar dos interesses da advocacia potiguar.
Atual vice-presidente da OAB-RN, ela assume postura oposicionista ao presidente Aldo Medeiros que, na sua opinião, não conseguiu entregar à advocacia a prometida atitude e nem a transparência proposta três anos atrás. No exercício da Vice-Presidência, explica que está limitada na função e sofreu resistência na implementação de projetos.
Na entrevista exclusiva a JuriNews, Rossana Fonseca destaca que quer fazer uma gestão participativa, mais transparente, que não seja dividida em castas e que atenda, proteja e abrace toda a advocacia do Rio Grande do Norte.
Sobre a atuação da OAB-RN na pandemia, ela é enfática a apontar omissão da gestão no momento em que a advocacia mais precisou da instituição e diz que não acha que a pandemia tenha atrapalhado a gestão, conforme alega o presidente Aldo que não se mostrou eficiente nesse difícil momento.
Confira a seguir:
QUAL É SUA MOTIVAÇÃO PARA SE LANÇAR CANDIDATA APRESIDENTE DA OAB-RN?
Um dos principais motivos é trabalhar pela advocacia, tal qual eu fiz quando presidi a Associação dos Advogados do Rio Grande do Norte. Como vice-presidente de uma entidade como a OAB, você participa das reuniões de diretoria e opina num colegiado, mas ainda que suas proposições sejam aceitas, a execução é privativa do presidente. Se ele não age, nada acontece. E muita coisa simplesmente não aconteceu nestes três anos, por mais que eu tivesse tentado junto a ele que fosse implementado. Acho que ele não conseguiu entregar à advocacia a prometida atitude e nem a transparência proposta três anos atrás. Dois exemplos são o não funcionamento da ESA e a não implementação do compliance. Este último, se tivesse sido implementado, teria evitado muitos dos problemas enfrentados pela gestão, pois teríamos tido auditorias periódicas nas contas da instituição. Eu trabalho em favor da advocacia há muito tempo. Na eleição passada, fui procurada por um grupo de advogados que entendia que, já naquela ocasião, eu poderia concorrer à Presidência da OAB, em razão do trabalho que desempenhei enquanto estive na Presidência da Associação dos Advogados do Rio Grande do Norte – AARN. Porém, entendi naquele momento que deveria me preparar melhor. Embora eu já conhecesse bem os problemas enfrentados pela advocacia, achava que, para presidir a OAB deveria conhecer melhor a instituição internamente. No cargo de vice-presidente pude me aprofundar nas questões ligadas à advocacia e, ao mesmo tempo, entender o funcionamento da estrutura interna da instituição, que funciona com várias outras estruturas ligadas a ela, como a ESA, a CAARN, o TED, as inúmeras comissões, as subseccionais, o Conselho Federal e o FIDA. Não basta saber de suas existências, é preciso conhecer o funcionamento e o regulamento de suas relações com a instituição. Sem isso, a presidência não consegue impulsionar o funcionamento de nenhuma delas em favor da advocacia. Hoje me sinto preparada para a responsabilidade de presidir a nossa instituição e cuidar dos interesses da advocacia.
HÁ ALGUM TEMPO A SENHORA DECLAROU QUE NÃO VAI APOIAR A REELEIÇÃO DE ALDO MEDEIROS. SENDO, ATUALMENTE, VICE-PRESIDENTE DA OAB-RN, A SENHORA ASSUME A POSTURA DE CANDIDATA OPOSICIONISTA À GESTÃO?
Sou candidata a presidente da OAB para fazer o que infelizmente não foi feito pelo presidente atual e que, conforme respondi na pergunta anterior, não se conseguiu que ele cumprisse o que tinha sido planejado. Este projeto de termos uma candidatura e uma nova chapa não é só meu, mas de um grupo representativo de advogados, que não concordam com a linha adotada pelo atual presidente. Respeitamos as decisões dele e temos uma ótima relação institucional, mas entendemos que pode e deve-se fazer mais, com maior dinamismo e propostas que sejam cumpridas. Não quero chegar ao final do mandato dando desculpas pelo que não fiz, e vejo isto acontecer agora com o presidente Aldo. Problemas sempre existirão, mas o que diferencia um gestor do outro é a forma como ele lida com os problemas. Você tem a opção de ficar se justificando pelas suas omissões e terceirizando a culpa, ou pode enfrentá-los e agir exatamente em função deles. Este é o meu perfil, quem me conhece sabe disso. Além de tudo isso, existe um motivo adicional, que mesmo não sendo o principal, diz muito sobre o momento que estamos vivendo na OAB. Durante a campanha de 2018 o atual presidente se colocava contra a reeleição, era uma posição pessoal, e ele assumiu o compromisso de não se colocar como candidato à reeleição. É um compromisso relevante, usado como critério para quem o escolheu, não pode ser considerado circunstancial. A não reeleição do atual presidente era fato consumado e, por isso, o meu apoio à sua recondução nunca foi pauta, pois tratava-se de um compromisso assumido por ele com a advocacia, especialmente com a parcela que não concorda com a reeleição.
CASO ELEITA, A SENHORA PODE SER A PRIMEIRA MULHER PRESIDENTE DA OAB-RN. QUAL O SIMBOLISMO DISSO E QUE TIPO DE MISSÃO LHE TRAZ?
De fato, a advocacia do RN nunca elegeu uma advogada para o cargo de presidente. A OAB ainda é um ambiente muito masculino. A Diretoria do Conselho Federal é composta somente por homens, o próprio Conselho Federal possui apenas 16 conselheiras, num ambiente de 167 conselheiros. Nos estados, a maioria esmagadora das seccionais nunca teve uma advogada na presidência. Esse retrato demonstra o quão difícil tem sido essa jornada para as mulheres dentro da Ordem, uma incongruência se pensarmos que a OAB pautou sua história lutando pela democracia. E o que é democracia, senão igualdade de direitos? Por isso é que, em termos de simbologia, sinceramente, não consigo romantizar isso e ver como sendo algo positivo. Ao contrário, vejo como um fato lamentável: pensar que em quase 100 anos de instituição ainda estamos lutando por algo tão simples e ao mesmo tempo tão óbvio, que é o fato de que a capacidade de liderar não está vinculado ao gênero que você incorpora. Mas é preciso registrar que OAB/RN já teve uma presidente, a Doutora Lúcia Maciel, que já fez história entre nós. No entanto, ela não foi eleita diretamente para o cargo de presidente, mas sim para o cargo de secretária geral e assumiu a presidência ante o afastamento do presidente e do vice da época. Tenho muito respeito e admiração pela Doutora Lúcia. Fico imaginando como deve ter sido presidir a instituição naquela época.
COMO FOI SEU TRABALHO PELO PROJETO DE PARIDADE DE GÊNERO NA OAB?
Inicialmente foi um trabalho de formiguinha. Precisei pacientemente ir tentando convencer algumas lideranças que não apoiavam o projeto, pelas mais diversas razões. O colégio de presidentes de seccionais, composto apenas por homens, nunca foi simpático ao projeto de paridade e aqui não foi diferente. O próprio presidente da OAB-RN resistiu à ideia. Por isso, precisei fazer um trabalho discreto de convencimento, porém persistente, para conseguir realizar primeiro uma audiência pública, porque eu entendia que esse assunto não poderia seguir para votação no Conselho Federal sem que a advocacia do Rio Grande do Norte, especialmente a mulher advogada, se pronunciasse sobre ele. Essa audiência pública contou com a presença da própria Valentina Jungman, autora do projeto, assim como a presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada Daniela Borges, além de Fernanda Marinela, que presidiu a primeira comissão nacional da mulher advogada em todo o sistema OAB. Contou ainda com a presença da Doutora Clea Carpi, única mulher a ter sido agraciada com a medalha Rui Barbosa em todo o sistema OAB, no Brasil todo. Eu promovi outros eventos que tiveram este tema como pauta. A essa altura já contava com o apoio de muitas advogadas e, juntas, fomos conseguindo mobilizar as pessoas e formamos um grande grupo de mulheres advogadas que, no dia da votação, tanto no colégio de presidentes, quanto no Conselho Federal, acompanharam voto a voto e, juntamente com advogadas de todo o Brasil, fizeram pressão para que o projeto fosse aprovado, apesar das tentativas de imposição de condicionantes por parte de alguns presidentes, para retardar a aplicação da nova regra. Felizmente, as tentativas foram vencidas e a paridade de gênero prevaleceu, para que fosse aplicada de forma imediata e já será uma realidade na eleição desse ano. Foi uma grande vitória e, confesso, uma grande emoção participar desse momento histórico e ter contribuído para essa importante conquista para a advocacia.
NA FUNÇÃO DE VICE-PRESIDENTE, COMO PODE DESTACAR A SUA ATUAÇÃO?
Costumo dizer que o cargo de vice-presidente não é tão fácil por que, diferentemente dos outros cargos da diretoria, que têm a sua função definida no regimento, o vice-presidente só age por delegação do presidente. A única função regimental da vice-presidência é presidir o Colégio de Presidentes das comissões, o que se pode entender como um trabalho de coordenação. Mas essa coordenação é bastante limitada, pois não há previsão de poderes expressos para a execução dos trabalhos, muito menos para nomear ou exonerar membros, atribuição que fica a cargo do presidente.
Assim, o trabalho consiste em estimular as comissões a realizarem os seus trabalhos. Por isso, procurei servir de estímulo, mas também de suporte e apoio, sugerindo formas alternativas de trabalho para que, mesmo na pandemia, as atividades das comissões não fossem suspensas. Antes, a relação das comissões com a diretoria era muito burocrática e isso impedia que o trabalho fluísse. Consegui diminuir a burocracia fazendo com que as autorizações para eventos, cursos, seminários e palestras, por exemplo, fossem autorizados por meio de links encaminhados via WhatsApp. Isso facilitou o fluxo de informações, tornou rápida a comunicação e possibilitou às comissões otimizar e aumentar a quantidade de eventos voltados à qualificação da classe, colocando à disposição da advocacia palestras com grandes juristas do país. Procuramos também prestigiar a advocacia local, convidando-os para proferirem palestras, contribuindo, no caso de vários deles, para que se posicionassem no mercado, divulgando o seu trabalho e, ainda, levando conhecimento a quem participava dos eventos como expectador. Tudo isso sem investimento financeiro, o que foi o mais difícil.Também estive sempre presente e à disposição para ajudar as subseccionais no que precisavam, integrei a participação das presidentes de subseccionais, fazendo com que todas tivessem participação especial nas iniciativas da vice-presidência.Procurei integrar as comissões do interior do estado às comissões da seccional, para que a advocacia do interior pudesse partilhar das mesmas iniciativas e oportunidades da seccional. Junto à diretoria, sempre me posicionei firmemente em favor de uma OAB mais ágil, mais acessível aos advogados, mais transparente, mais participativa e mais inclusiva. Junto ao conselho sempre me posicionei pela defesa instransigente das prerrogativas da advocacia, sem descuidar do papel fiscalizador da instituição. Minhas posições sempre foram pautadas no que acredito, mas sempre com respeito às opiniões divergentes.
A PANDEMIA TROUXE UMA NOVA REALIDADE PARA A ADVOCACIA BRASILEIRA. COMO A SENHORA AVALIA A ATUAÇÃO DA OAB NA PANDEMIA E QUAIS OS DESAFIOS ENFRENTADOS PELOS ADVOGADOS POTIGUARES NESSE NOVO CENÁRIO?
Acho que houve omissão durante a pandemia. Faltou ATITUDE. Nesse período a advocacia não conseguia acesso às secretarias, tampouco aos magistrados. As dificuldades com levantamento de alvarás eram imensas. A advocacia ficou à própria sorte. Era angustiante ver a passividade, ainda que as cobranças ocorressem, tanto por parte dos presidentes de subseccionais, quanto da própria Diretoria. Eu mesma cobrei algumas vezes por providências junto ao Tribunal, até que eu mesma marquei uma reunião em que participaram todos os Presidentes de subseccionais.
Não acho que a pandemia tenha atrapalhado a gestão, conforme alega o presidente Aldo. Acho que a gestão deveria ter se mostrado eficiente exatamente na pandemia, por que foi quando a advocacia mais precisou da OAB. Lamentavelmente, muitos escritórios fecharam durante a pandemia, muitos por não conseguirem manter suas estruturas, o que é muito triste. Outros por opção, já que hoje vc pode ter o seu escritorio no seu notebook. Será preciso investir em salas de coworking. Uma questão que precisa ser enfrentada é a realidade de quem trabalha fazendo somente correspondência. Esse mercado sofreu um grande abalo e a ordem precisará discutir sobre saídas para esses profissionais. As mudanças estão ocorrendo de forma rápida e a melhor maneira de ajudar a advocacia é com uma ESA forte e atuante. Qualificação é o caminho.
A SENHORA ACHA QUE O ADVOGADO EM INÍCIO DE CARREIRA MERECE NESTE MOMENTO MAIOR ATENÇÃO?
O advogado em início de carreira sempre precisou de maior atenção. Mas, hoje, eu diria que essa atenção deve ser redobrada. O aumento excessivo da quantidade de cursos de direito nas inúmeras universidades espalhadas pelo país, por um lado, gera mais oportunidades de acesso a um curso superior para muitos jovens, mas, por outro lado, tem atingido a qualidade da formação. Por isso é que eu tanto defendo a atuação da ESA e sinto que ela tenha sido desprezada pelo atual presidente. Quando fui presidente da AARN firmei um convenio com a Universidade do País Basco, na Espanha. Hoje sou mestranda em direito, em decorrência desse convênio feito por meio de uma instituição de pequeno porte como a AARN. Imagine o que poderemos fazer à frente de uma instituição como a OAB, grande e cheia de representatividade. Nesse aspecto a ESA faz muita falta, e é inaceitável que não tenha funcionado, voltando-se para a formação e qualificação da advocacia, especialmente dos novos advogados.
E QUAIS SÃO AS PROPOSTAS QUE A SENHORA TEM PARA A ADVOCACIA POTIGUAR?
Tenho andado bastante, visitado e recebido grupos de advogados, com quem tenho conversado e escutado muito. A ideia é construir um projeto alinhado com as necessidades atuais da advocacia, além de executar coisas que o atual presidente não logrou realizar. Diante do que tenho escutado, já tenho algumas premissas sobre as quais irei trabalhar.
Muitas são as necessidades, a começar pela procuradoria de prerrogativas que, embora tenha sido uma inovação, ainda segue precisando de muitos ajustes. Não pretendo ser uma presidente que vive sentada na cadeira da presidência, esperando que os problemas cheguem até mim. Pretendo me adiantar aos problemas e tentar resolvê-los na raiz. Alguns problemas se repetem e precisam de uma intervenção direta de quem preside a instituição.
O sistema de atendimento ao advogado na própria OAB também precisa ser imediatamente revisto. A advocacia reclama que não é bem atendida, que tem dificuldade de comunicação com a instituição para solicitar alguns serviços e que não consegue, por exemplo, extrair um boleto no sistema para realizar o pagamento da própria anuidade. Se a Ordem não dá condições à tesouraria para receber as anuidades, imagine como está sendo feito o atendimento de quem precisa dos serviços. As reclamações são constantes.
A instituição precisa de maior dinamicidade nos processos internos, a exemplo do que acontece com a comissão de prerrogativas, que trabalha muito, julga muitos processos e o faz com muito zelo, mas é preciso tornar esse procedimento mais ágil, para que os desagravos, por exemplo, não sejam julgados dois anos depois do fato ocorrido, quando já não produzem mais efeito perante o violador de prerrogativas, menos ainda perante o agravado.
A instituição também precisa implementar urgentemente um sistema de boas práticas na instituição, com a implantação do compliance, que eu tentei executar na atual gestão, mas não houve interesse por parte do presidente.
Vou fundamentalmente ABRIR AS PORTAS DA OAB-RN para toda a advocacia, tenha ela votado em qualquer dos candidatos. Não quero demorar um ano para nomear um advogado que pretende integrar uma comissão, nem vetar advogado para participar de eventos simplesmente por que não votou na chapa que eu venha a integrar. Quero fazer uma gestão participativa, que não seja dividida em castas e que atenda, proteja e abrace toda a advocacia do Rio Grande do Norte. Sem brigas, sem desentendimentos, sem radicalismos.
Esse é o meu desejo.
Fonte: Portal JuriNews