Em negócios celebrados após a entrada em vigor do Código Civil de 2002, deverá ser aplicada a regra do seu artigo 1.647, inciso I – que prevê a dispensa da autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca no regime da separação absoluta de bens –, mesmo que o casamento tenha acontecido ainda sob o Código Civil de 1916.
O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) que, em virtude da falta de autorização das esposas dos dois sócios de uma empresa, havia declarado a nulidade da hipoteca de imóvel dado em garantia no momento da celebração de contrato de crédito industrial.
Para o TJPB, como os casamentos foram realizados na vigência do CC/1916, deveriam ser obedecidas as normas desse código, inclusive em relação à necessidade de consentimento sobre a garantia, mesmo na hipótese de regime de separação de bens.
A relatora do recurso especial do banco credor, ministra Nancy Andrighi, lembrou que o artigo 1.687 do CC/2002 prevê que, estipulada a separação de bens, o patrimônio permanecerá sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que poderá livremente aliená-lo ou gravá-lo com ônus real. Entretanto, a ministra também lembrou que, segundo o artigo 2.039 do mesmo código, o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do CC/1916 é por ele estabelecido.
Segundo a ministra, o artigo 2.039, ao fixar uma regra de transição quanto ao regime de bens, teve por finalidade disciplinar as relações familiares entre os cônjuges na perspectiva patrimonial, regulando como ocorrerá, por exemplo, a partilha dos bens por ocasião da dissolução do vínculo conjugal.
Sem influência
Por esse motivo, a relatora entendeu que não seria possível concluir que o artigo 2.039 do CC/2002 deva influenciar, na perspectiva do direito intertemporal e da definição da legislação aplicável, as hipóteses em que deveria ser dada autorização conjugal, pois esse instituto, “a despeito de se relacionar com o regime de bens (pois, em última análise, visa proteger o patrimônio do casal), é, na realidade, uma condição de eficácia do negócio jurídico cuja validade se examina”.
“Em outras palavras, é correto afirmar que, em se tratando de casamento celebrado na vigência do CC/1916 sob o regime da separação convencional de bens, somente aos negócios jurídicos celebrados na vigência da legislação revogada é que se poderá aplicar a regra do artigo 235, I, do CC/1916 (que previa a necessidade de autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca, independentemente do regime de bens)” – esclareceu a ministra.
No caso dos autos, como o negócio que se buscava invalidar foi celebrado em 2009 – ou seja, já na vigência do CC/2002 –, a relatora concluiu que deveria ser aplicada a regra do artigo 1.647, inciso I, do código vigente, que dispensa a autorização conjugal na hipoteca quando o matrimônio, mesmo realizado sob o CC/1916, tiver estabelecido o regime da separação convencional de bens.
Leia o acórdão.