Mal o segundo semestre de 2021 se inicia, o Brasil já assiste mais uma crise institucional, cujo cerne, desta vez, envolve a polêmica do voto impresso nas próximas eleições.
O Presidente Jair Bolsonaro, ao se referir ao Ministro do Supremo Tribunal Federal e atual Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luís Roberto Barroso, que é contra o voto impresso, utilizou-se de palavras chulas e de baixo calão, ofendendo a honra do magistrado.
É bem verdade que, em uma nação guiada pelos princípios democráticos, deve-se conviver com opiniões divergentes e conciliar os conflitos através de suas instituições, todas legitimamente validadas pela vontade popular.
Ocorre que, nesta democracia, somente poderá se albergar o debate de ideias e ideais, resguardando, nos termos da Constituição Federal, as garantias e direitos individuais, incluindo a honra interna ou externa de cada um e de todos os cidadãos.
Quando, a pretexto de debate público, os argumentos cedem espaço à injúria, calúnia e difamação, levando a discussão ao pântano da imundície moral, devem se levantar as vozes da razão e a força da Justiça para restaurarem o liame que separa a civilização da barbárie, a democracia do autoritarismo, e o respeito ao outro do domínio do mais forte.
Foi nesta toada que autoridades e instituições de todos os matizes ideológicos saíram em defesa da democracia, lamentando e repudiando o ato infeliz do Presidente da República.
A Comissão Especial de Direito Eleitoral – CEDE, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, declarou ser “inadmissível que um homem público, que jurou respeitar a Constituição e leis, ataque ministros da Suprema Corte e desfira ameaças ao regime democrático, caso não haja o retorno do voto impresso”.
O Instituto Brasileiro de Direito Eleitoral – IBRADE, que possui, dentre seus membros, vários ex-ministros do TSE, também se posicionou em uma dura nota, a qual pontuou que “a intolerância desenfreada e o desferimento de ofensas pessoais contra membro do Poder Judiciário não contribuem para o crescimento das instituições. Não são ações republicanas. São atos lastimáveis e constrangedores”.
Por estas plagas, o Instituto Potiguar de Direito Eleitoral – IPDE – acompanhou a indignação e perplexidade dos demais ao lembrar, em sua nota, que “o respeito entre as instituições e as autoridades públicas é primordial”.
De fato, para além das ofensas pessoais entre autoridades, a onda de repúdio representa um sentimento crescente de que o mandatário do mais alto cargo da República, com seus atos inconsequentes (ou dolosos), ameaça à democracia ao flertar com o autoritarismo e desprezo aos demais Poderes.
A propósito, nas palavras do Advogado Eleitoralista e ex-membro titular do Tribunal Regional Eleitoral do RN, Wlademir Capistrano, “a democracia é valor indissociável da sociedade contemporânea. Atentar contra a democracia é atentar contra o Estado de Direito e contra a dignidade das pessoas. A fala do presidente da República, atacando infundadamente o sistema eleitoral e denegrindo a honra do ministro Luís Barroso, revela o seu descompromisso com o debate democrático e o seu despreparo para o exercício da magistratura máxima da nação”.
A democracia é, sim, generosa e suporta tudo, até mesmo questionamentos sobre a sua utilidade ou a das suas instituições.
No entanto, todo e qualquer debate deve se pautar pelo respeito ao próximo, sendo merecedor de censura aquele que, com palavras ou ações, descambe para a seara da violência e agressões gratuitas, uma vez que qualquer ato dessa natureza atenta, não somente contra o alvo escolhido pela selvageria, mas, também, contra toda a nação.